História

Quilombo: o que é e como surgiu no Brasil

A palavra quilombo significava originalmente “acampamento guerreiro na floresta” em bantu, língua falada por diversos povos da região de Angola, local de onde vieram muitos dos escravos africanos que foram trazidos ao Brasil entre os séculos XVI e XIX.

Foi no Brasil Colonial [1] e Imperial que o termo passou a ser utilizado para designar comunidades de escravos fugidos no período escravocrata. Seus habitantes eram chamados de quilombolas. 

Os quilombos, também chamados de mocambos, representam um dos maiores símbolos de resistência e oposição ao sistema colonial escravista. Mas é importante lembrar que eles não se formaram somente no Brasil: desde o início do tráfico negreiro, surgiram quilombos na América. Segundo Schimidt, “onde houve escravidão, houve resistência”.

Quilombo no Maranhão

Imagem de casas de um quilombo ainda existente no Estado do Maranhão (Foto: Reprodução | Wikimedia Commons)

Até hoje existem no Brasil, como grupos que fazem uso comum da terra em que habitam, com suas próprias normas e costumes, sendo regulamentados pela Constituição de 1988. 

Exemplos de quilombos

Durante o período de escravidão [2], o Brasil teve centenas de quilombos em seu território, que estiveram presentes em quase todos os estados.

Dentre os principais quilombos brasileiros, o mais conhecido foi o Quilombo dos Palmares, uma confederação de quilombos, ou seja, um agrupamento de vários quilombos diferentes, localizado na então Capitania de Pernambuco, atual Alagoas.

Destaca-se também o Quilombo do Campo Grande, também organizado como uma confederação, localizada na região Centro-Oeste e Sudeste do país, com cerca de 25 núcleos, entre eles: o Quilombo de Ambrósio, do Quebra-Pé e do Kalunga. 

Mapa com número de quilombos no Brasil

Gráfico com numero de quilombos ainda existentes no Brasil (Foto: Reprodução | Wikimedia Commons)

Como surgiram?

A formação dos quilombos [3] está fortemente relacionado com o tráfico negreiro e a escravidão na América. O tráfico negreiro foi a atividade comercial de escravos negros realizada entre três continentes, Europa, África e América do séculos XVI a XIX. 

A escravidão e o comércio de escravos já existiam entre os povos africanos, o que facilitou que estes fossem comercializados por europeus e enviados como escravos no continente americano, a fim de suprir a demanda de mão-de-obra nos latifúndios das colônias.

Os escravos africanos chegavam em território brasileiro para trabalhar principalmente nos engenhos de cana-de-açúcar, minas e lavouras cafeeiras. Sua rotina de trabalho era composta por excesso de trabalho, condições precárias, violência, castigos, maus-tratos, açoitamentos, torturas e alimentação insuficiente.

Além disso, seus hábitos culturais e religiosos foram perseguidos e forçadamente alterados no Novo Mundo.

Como resultado, há diversas formas de resistência que foram utilizadas pelos escravos africanos no Brasil, e podemos separá-las em duas categorias principais:

Sendo assim, os quilombos surgiram no Brasil tanto como uma forma de rejeição à dominação, à repressão e à violência imposta pelos senhores, quanto como uma possibilidade dos escravos africanos recuperarem sua identidade, tradições e costumes. 

Vale lembrar que ao longo do período de escravidão no Brasil, outros motivos levaram à formação de quilombos, como ocupação de terras desocupadas, doações, entre outros.

Como era a vida nos quilombos?

Os hábitos de vida nos quilombos são pouco conhecidos. Inúmeras comunidades estavam espalhadas pelo território brasileiro, que tiveram que se adaptar às condições locais para sobreviver.

Isto aponta que não houve um único padrão de organização social e política. Por sua vez, os poucos registros sobre o tema são apenas indicativos, pois foram escritos pelos colonizadores, quando estes conseguiam atacar um quilombo.

A característica principal dos quilombos no Brasil, diferente do restante da América, foi o não isolamento. Isso significa que os quilombos estavam localizados em regiões produtivas e próximas a centros populacionais e fazendas, embora muitas vezes em locais de difícil acesso.

A partir dos relatos dos europeus sobre o Quilombo dos Palmares, podemos observar várias semelhanças com a organização social e política dos ki-lombos de Angola, que se mesclaram a elementos de outros povos africanos e a novos elementos coloniais.

Suas principais semelhanças e características foram:

1- Variedade étnica e ausência de parentesco

Os quilombos eram habitados não só por escravos, mas também por crioulos, índios, mestiços e até mesmo brancos. Desse modo, eram comunidades formadas por pessoas de origens diferentes, que não compartilhavam nenhum laço de parentesco.

2- Agrupamento militar de vários estados menores em torno de um reinado principal

Haviam confederações de quilombos, como o Quilombo dos Palmares e o Quilombo do Campo Grande, que eram um agrupamento de vários quilombos menores sob a liderança de um ou mais quilombos principais. Palmares foi atacado pelos colonizadores por diversas vezes ao longo da sua existência, o que mostra a força de seu poderio militar.

3- Hierarquia baseada na figura do líder

Quilombos que foram conhecidos por seu poderio militar possuíam um líder, que se assemelhava a figura de um rei africano.

4- Atuação mercenária e papel secundário da agricultura

Sua economia tinha fortes elementos parasitários, ou seja, viviam às custas de saques, assaltos, ataques e comércio ilegal. Essas atividades combinavam-se à práticas agrícolas, principalmente o cultivo de mandioca, à pesca e à caça. Além disso, pela proximidade com os centros populacionais, os quilombolas estabeleceram trocas comerciais com diferentes grupos da sociedade colonial.

5- Escravidão

Assim como na África, a escravidão esteve presente em alguns quilombos, como o de Palmares: os que eram capturadas nos assaltos se tornavam escravos.

Zumbi dos Palmares

Zumbi dos Palmares

Zumbi foi o último líder do Quilombo dos Palmares e ficou famoso pela resistência nas batalhas finais (Foto: Reprodução | Wikimedia Commons)

O Quilombo dos Palmares, localizado no atual território de Alagoas, foi a maior comunidade de escravos fugidos no Brasil, chegando a ter até 20 mil habitantes. Algumas figuras de grande renome fizeram parte deste quilombo, como Ganga Zumba, Zumbi, e Dandara, uma importante guerreira e esposa de Zumbi. 

Seu primeiro líder, Ganga Zumba, foi envenenado dias depois de tentar uma negociação de paz com o governador da Capitania de Pernambuco, em 1678, que não agradou aos quilombolas.

Com a morte de Ganga Zumba, Zumbi passa a ser o novo e último líder do Quilombo dos Palmares. O personagem ficou famoso pela resistência nas batalhas finais e pela recusa em aceitar as negociações de paz das autoridades coloniais, que tinham como objetivo reescravizar escravos fugidos.

Além disso, a atuação de Zumbi foi marcada por uma grande ferocidade militar, com ataques surpresas a engenhos, libertação de escravos e saques. 

Isto fez com que o governo de Pernambuco contratasse bandeirantes, com armas e munições, para destruir Palmares e matar o seu líder. Zumbi foi encontrado após muitas buscas e foi assassinado em 20 de novembro de 1695. O Quilombo de Palmares resistiu até 1710 com poucos sobreviventes e sem líder.

Zumbi é considerado um marco da luta negra à opressão do sistema colonial escravocrata e por isso a data da sua morte foi escolhida para representar o Dia da Consciência Negra [4] no Brasil.

Resumo do Conteúdo
Nesse texto você aprendeu que:

  • Os quilombos são um local de resistência contra a escravidão no Brasil Colonial e Imperial.
  • O quilombo mais famoso é o Quilombo de Palmares e seu último líder foi Zumbi.
  • A formação dos quilombos está relacionada ao tráfico negreiro e à escravidão na América.
  • Os quilombos possuíam relações com o mundo exterior (políticas, sociais e econômicas), mas foram duramente reprimidos ao longo da história.
  • As formas de organização social, política e econômica africanas, principalmente as da Angola, influenciaram muito a dinâmica da sociedade escravocrata brasileira.

Exercícios resolvidos

1- O que foram os quilombos e quem eram os quilombolas?
R: Os quilombos foram locais de resistência a escravidão e seus membros eram conhecidos como quilombolas.

2- Como surgiram os quilombos?
R: Os quilombos surgiram no Brasil como uma forma de resistência à sociedade colonial escravocrata, em que negros africanos se libertaram da sua condição de escravos e pudessem recuperar sua identidade, tradições e costumes.

3- Quais as principais características dos quilombos no Brasil?
R: Não isolamento, variedade étnica e ausência de parentesco, agrupamentos similares a confederações, organização militar, hierarquia baseada na figura do líder, atuação mercenária, como saques, ataques e captura de escravos, papel secundário da agricultura e escravidão.

4- O que foi o Quilombo dos Palmares?
R: O Quilombo dos Palmares, localizado no atual território de Alagoas, foi a maior comunidade de escravos fugidos no Brasil, chegando a ter até 20 mil habitantes.

5- Quem foi Zumbi dos Palmares?
R: Zumbi foi o último líder do Quilombo dos Palmares. Ele ficou famoso pela resistência nas batalhas finais e pela recusa em aceitar as negociações de paz das autoridades coloniais. Por isso, é considerado um marco da luta negra à opressão do sistema colonial escravocrata.

* Fabíola Magossi é bacharel e licenciada em História pela Universidade de São Paulo.

Referências

» CARNEIRO, E. O Quilombo dos Palmares, 1630-1695. São Paulo: Brasiliense, 1947.

» FREYRE, G. Casa Grande e Senzala, 50ª ed. Global Editora, 2004.

» HARTUNG, M, F; O sangue e o espírito dos antepassados: escravidão, herança  e expropriação no grupo negro Invernada Paiol de Telha – PR. Florianópolis:NUER/UFSC, 2004.

» LARA, S. H.. Palmares: um reino africano no Brasil?. Impressões Rebeldes. Documentos e palavras que forjaram a História dos protestos no Brasil, 20 nov. 2019. Disponível em: https://www.historia.uff.br/impressoesrebeldes/?temas=palmares-um-reino-africano-no-brasil [5]. Acesso em: 07 de fevereiro de 2020.

» MOURA, C. Dicionário da Escravidão Negra no Brasil. São Paulo: Edusp, 2004.

» REIS, J. J.; GOMES, F. S. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo, Cia. das Letras, 1996.

» SCHIMIDT, M,. Nova História Crítica. São Paulo: Nova Geração, 2005.

» SCHWARCZ, L. M.; GOMES, F. S. (Orgs.). Dicionário da escravidão e liberdade: 50 textos críticos. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

» SILVA, S. R. NASCIMENTO, L. K. Negros e territórios quilombolas no Brasil. IN: Cadernos CEDEM, UNESP, v.3, n.1, 2012.